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Sunday, December 1, 2013

Um de Dezembro:

Como Novembro acabou assim começou Dezembro. Frio e um vento brando como se usa dizer mas que faz com que a aragem seja mais agreste. Era o que acontecia às primeiras horas da manhã. E quem como eu passava defronte ao Tejo mais se apercebia disso. Mas era se o meu pensamento fosse só esse. Mas não era.
Havia bastante inquietação para aqueles lados. Gritos e mais gritos. Correrias de soldados e bastantes carros militares a dirigirem-se para aqueles lados. Seriam manobras militares! Não. Quando assim é os militares não põem tanto profissionalismo em acção. Algo de mal devia estar a acontecer. Ou de bem! De mal não devia ser. E, como diz um refrão que o povo canta: para melhor está bem, está bem, para pior já basta assim. Era no que ia a matutar.
Até que cheguei mais próximo e pude ver com os meus próprios olhos, mas de uma distância considerável, uma rebolisse dantesca. Tiros, gritos, avanços e recuos. Os portões do Palácio de Belém não resistiam a tanto. Era o que ouvia dizer que dado à distância a que me encontrava não me podia aperceber. Cada vez me aproximava mais. Sou curioso por natureza e para não deixar essa curiosidade por mãos alheias à que avançar até ao local do “crime”.
Mas foi-me dito logo por um soldado que não podia avançar. Estavam ali para defender o Presidente da Republica. Olhei para o seu uniforme e apercebi-me que pertencia ao Batalhão de Caçadores 5 situado em Campolide. Aqui pensei para mim: queres ver que é uma contra revolução. Este meu pensamento advém de aquando à Revolução do Vinte e Cinco de Abril este Batalhão ser um dos primeiros a aderir. E, hoje estar ao lado de quem só prejudica o País. Nessa altura estiveram ao lado dos mais desfavorecidos e hoje estão do lado deles! Senti tristeza. Foi ali que tirei a especialidade quando fui soldado.
Só pode ser um golpe da extrema-direita. Mesmo assim ainda estão descontentes com a situação! Mas de repente vejo Vasco Lourenço, Otelo Saraiva de Carvalho e outros antigos militares fardados acompanhados por Mário Soares. Aqui o meu sorriso foi enorme. E olhei para o dito soldado do Batalhão de Caçadores 5 com indiferença. Sei que é um simples soldado e só recebe ordens. Mas os seus comandantes não seguem os ensinamentos dos de outrora: só e sempre ao serviço da Grei.
A revolução dava mostras de ir para a frente. Agora com Vasco Lourenço, Otelo Saraiva Carvalho e Mário Soares ali só tem que haver um final feliz. Até o soldado que nos obstava de prosseguir tinha desaparecido. Isto revelava que os revoltosos estavam a conseguir a seus intentos. E… ainda bem. O Okupa - como alguns se referem a Cavaco Silva - estava no seu fim político. O outro - o Okupa de S. Bento - nem valia a pena lá ir. Como já devia estar a par dos acontecimentos há muito que tinha dado de frosque. É que são todos fortes quando as Forças de Segurança os protegem. Mas não era o que estava a acontecer. Ou melhor. Seria se o Exército não tomasse a iniciativa. Mas como tomou as outras Forças de Segurança tiveram receio.
Assim os primeiros a renderem-se foram os que fazem segurança ao Palácio de Belém. Depois tudo foi efeito dominó. Como estava contente por assistir a tal revolução. Aqui lembrei o 1º. de Dezembro de 1640. E lembrei-me como uma e outra data nos livrava do efeito opressor. A de 1640 do jugo Espanhol a de hoje do jugo da Troika.
Eram abraços e mais abraços dos que assistiam e dos que lutavam em defesa da democracia. Isto sim! Aqui está o verdadeiro povo e a verdadeira democracia. Ela é feita na rua nas fábricas e no campo. Os que sentem as agruras da vida no do dia-a-dia. Os mais desfavorecidos. Nunca os dos gabinetes.
Até os sem-abrigo não se importaram de serem acordados pelo barulho do crepitar das armas e das vozes de comando que eram dadas em altos gritos. Diziam: por uma boa solução vale a pena ser acordado. E dizia, para comigo: se aquilo é dormir não sei o que é dormir. A minha gata tem melhores condições. Todas as noites quando estou a dormir vai para os meus pés e por cima da roupa da cama ali faz a sua cama. Dorme a bom dormir.
Mas, com isto não quero fugir da minha revolução. Sim. Esta revolução também era minha. Presenciei-a e sofri por ela. Mas teve um final feliz. As pessoas, cada vez mais, vinham dar largas à alegria. Houve quem cantasse a Portuguesa. 
Aqui lembrei o 1º de Dezembro de 1640 e os 40 Conjurados que deram inicio à revolução. O local não era o mesmo mas quem se importa com locais. Isso era noutros tempos em que as guerras tinham lugar marcado. Aqui não era uma guerra. Era uma revolução. 
Cada vez pensava mais nisso até que ouvi mios de gato. E… fiquei perplexo. Gatos no meio da revolução! Queres ver, dizia para mim, até os gatos não tem medo dela e são democratas!
Só que o miar era cada vez mais e com isso fez-me acordar. Acordar! Sim. Todos os dias a minha gata o faz àquela hora. Então vi que tudo não passou de um sonho. Sonho bonito. Mas não passou disso. O que dava para ser realidade. 
Assim tenho de conviver com os dois Okupas. O do Palácio de Belém e de S. Bento. E fica-me na recordação o 1º de Dezembro de 1640. É o que vou festejar neste dia frio e soalheiro de Dezembro.

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