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Wednesday, January 8, 2014

A moeda da minha avó:

Dentro de seis dias vou à China. Agora, subo a colina da Ajuda afim de me despedir da minha avó. Faço-o sempre que viajo e, invariavelmente, ela recomenda: "Cuidado com o avião." É uma avó muito bela: pequena, seca, teias de rugas que se entrecruzam, só osso, sofrimento e coragem. Quando fiquei sem mãe ela descia ao bairro da cidade onde o meu pai e eu vivíamos, para verificar se estava tudo bem. "Comes bifes?, bebes leite?", perguntava repetidamente. Vou no Volkswagen, série 18, com dois óculos na retaguarda, prestações mensais de 10 escudos, o carro traqueja, estou feliz, talvez porque seja a quadra das festas, talvez porque é o meu primeiro carro, porque vou viajar e porque vou ver a minha avó. Talvez isso tudo.
O carro não dispõe de mudanças automáticas, adquiri-o em segunda mão, tenho dificuldade em mudar de velocidade, o motor regouga, vou fazer 24 anos, e sou o senhor do mundo. China, Cuba, a palavra revolução sempre me refulgiu no prestígio que comporta. Ainda hoje. E os nomes que a emolduram são os nomes de laços inalteráveis, mesmo que tudo depois se contorça e desmorone. Mao Tse-tung e Chu En-lai, Fidel Castro e Camilo Cienfuegos. Fidel, na Sierra Maestra, a ler L"esprit des Lois, de Montesquieu. Mao e a Grande Marcha. Tudo isto poderá ser esquecido?
O jornal onde trabalho conseguiu que viajasse para lá de Macau. "Escreve, sobretudo, o que sentires, não apenas o que vejas", recomendou--me o chefe da Redacção. Subo a colina da Ajuda, e a felicidade transborda de mim. Li os livros de Claude Roy e de Malaparte, e os impressionantes relatos dos padres jesuítas que chegaram além do sítio aonde vou. E levo comigo a Bíblia, oferta de um tipógrafo anarquista, Eurico Ventura, que me ensinou a transcendência do homem e a grandeza daquilo que desconhecemos.
Uma vez, para tranquilizar a minha avó, disse-lhe que ia viajar, sim, mas desta vez de barco. Aflita, respondeu-me: "E se um avião cai em cima do barco?" Sorrio, no interior do Volkswagen, comovido com a genuinidade de uma mulher que passou por tudo o que de áspero a vida tem para oferecer e nunca perdeu a candura nem a capacidade de se espantar.
Reparo, agora, a meio da calçada, que na leitaria do Zenida montaram um rectângulo e que numerosas luzes coloridas iluminam o estabelecimento. Surpreendente para quem como o Zenida é um unhas-de--fome, e aquele gasto de electricidade poderia parecer-lhe desnecessário por supérfluo. Ocasionalmente, os ventos do Norte pareciam transfigurar a colina, e o palácio alargava as sombras temerosas. Já não há esses ventos, é estranho como tudo muda, penso agora ao pensar na minha avó, ao chegar junto dela, engelhada e frágil. Olha-me, beijo-a, pega-me na mão, coloca na palma um objecto redondo, uma moeda de 5 escudos. "É para a tua viagem." Ainda tenho a moeda. Está aqui: veja-a.
Tudo isto aconteceu?
Baptista Bastos
No DN de hoje

Tuesday, January 7, 2014

Falar de Eusébio:

É fácil. É daquelas personagens que chegam vêem e conquistam quem o rodeia. Fez um ou dois jogos pelas reservas do Sport Lisboa e Benfica e alcançou logo a titularidade. Sabe-se que quando assim acontece alguém é sacrificado. Esse alguém foi Santana. Que grande ídolo! Depois de andar pelos Salgueiros veio parar ao Sport Clube Freamunde como treinador-jogador. Aqui esteve vários anos. Certamente bebeu água do Agrêlo. E não deve ter sido pouca por que fez de Freamunde a sua segunda terra. Rumou daqui para o cemitério de Benfica onde está sepultado desde mil novecentos e oitenta e nove.
Eusébio mostrou ser um goleador nato e em boa hora veio render José Águas. Fazia-nos delirar com os seus dribles em corrida com os seus remates fosse da forma que fosse. Um guarda-redes não sabia qual o momento do remate. Para Eusébio não havia impossíveis. Teve um início auspicioso.
Lembro-me dos muitos jogos que vi através da Televisão. Pessoalmente só o vi uma vez em Guimarães. Mas há coisas que não saem da minha memória. E a do Campeonato do Mundo de Futebol (Jules Rimet) de mil novecentos e sessenta e seis é que não me deixa. 
Na primeira fase Portugal foi classificado em primeiro lugar e a Hungria em segundo. Eis os resultados de Portugal: Portugal 3-1 Hungria, Bulgária 0-3 Portugal, Brasil 1-3 Portugal. Depois da qualificação há que esperar pelo primeiro jogo da fase de eliminatórias marcado para o dia vinte e três de Julho.
As festas Sebastianas tinham sido antes quinze dias e de arromba como já era apanágio em Freamunde. Andávamos felizes por uma e outra coisa. Nos quatro dias que antecederam o jogo não faltavam comentários sobre a próxima eliminatória à porta do Café Américo. É que a partir da fase de grupos vinham as eliminatórias e diziam muitos que agora é que se ia ver quem tinha unhas para tocar viola. Calhou-nos a Coreia do Norte. Como nós também era uma estreante por estas andanças. 
Nesse tempo Portugal padecia de tudo: pobreza, analfabetismo. Trabalho é claro que não faltava mas ganhava-se pouco para o muito que se trabalhava. O horário era das oito horas às doze com intervalo de uma hora para o almoço e das treze às dezassete de segunda a sábado. Anos mais tarde veio a “semana-inglesa” e pouco anos depois a “semana-americana”. Se o jogo era às quinze horas tinha-se que perder tempo o que os patrões não estavam de acordo. Havia obra para entregar e se não fosse entregue os patrões não recebiam e não podiam fazer o pagamento semanal aos seus empregados. A mim acontecia o mesmo.
Trabalhava na Oficina de Estofos Hernâni em Paços de Ferreira. Foi um grande Freamundense. Naquela altura quem não fosse de Freamunde pelo menos todos os Domingos aqui fazia poiso quer fosse a assistir aos jogos de S. C. Freamunde ou nas tabernas, cafés e outras coisas mais. O senhor Hernâni tinha sido massagista do Sport Clube Freamunde. Mas com ia dizendo todos os seus empregados queriam assistir ao jogo via Rádio Televisão Portuguesa e o senhor Hernâni como bom português que era também queria mas tinha o compromisso da entrega da obra aos seus clientes e com isso o recebimento do dinheiro para pagar aos empregados. Combinou-se o seguinte: de sexta para sábado trabalha-se ininterruptamente até toda a obra ficar pronta. E… assim aconteceu. No sábado por volta das dez horas podemos dar por findo o nosso acordo. Já não podia com o corpo. O sono era muito.
Dormi umas horas e pus-me a pé para almoçar e depois rumar ao Café do Américo para assistir ao jogo sem antes fazermos um jogo de futebol no campo da feira. Chegou-se às quinze horas à que ir guardar lugar nas cadeiras do café. Estava o café à pinha. Começado o jogo sofremos logo um golo. Passados poucos minutos o segundo e o terceiro. Que desilusão. Passar uma noite inteira a trabalhar e ver que os jogadores portugueses não estavam a fazer um mínimo de esforço para contrariar aquele resultado.
Pensava para mim: Portugal na primeira fase tinha sido fogo-de-vista. Lembrava as conversas havidas à porta do Café Américo: “agora é que se ia ver quem tinha unhas para tocar viola”. Tinha que dar razão aos “Velhos do Restelo”. Mas estava neste pensamento quando Eusébio, quem havia de ser, reduzia para um a três. A primeira parte não acabou sem que Eusébio, novamente ele, reduzir para dois a três através de uma grande penalidade cometida sobre Torres. Mas não era o bastante até que o intervalo chegou.
Lá abandonamos o café para dar seguimento ao jogo que tinha sido interrompido. Aproximava-se o início da segunda parte e uma boa parte dos que estavam a jogar já não sentiam vontade de a ir assistir. Eu fui. Se trabalhei uma noite inteira para esse efeito tinha de assistir. Mais a mais depois queria ter bases para fazer críticas. Mas não foi preciso.
Pouco tempo depois de começar a segunda parte Portugal faz os três a três. E quem devia ser o marcador do golo? É claro! Eusébio. A gritaria foi estrondosa. O Café Américo fica a cem metros do campo da feira. Acto contínuo o café ficou repleto e todos gritavam: só mais um. E não é que quando Eusébio vai ficar isolado sofre dois derrubes. Jogada clara para penalti. O árbitro nem hesitou.
Eusébio continuava no chão a ser tratado pelo massagista da selecção nacional Manuel Marques. No café todos pedíamos para o Eusébio se recompor. A alguns pouco faltou para rezarem. Mas as mãos milagrosas de Manuel Marques tudo resolvia. Eusébio dirigiu-se para a marca da grande penalidade a coxear. Batia com as mãos na perna dando a entender que estava adormecida. Que raio de sorte. Só tínhamos confiança nele. Logo agora que podia ser resolvido o resultado.
Mas eis que Eusébio parte para a bola e esta acaba dentro da baliza. Que algazarra no café! Todos se abraçavam e até os velhos do Restelo se rendiam à evidência. A partir dali era fazer um jogo inteligente para segurar o resultado. Os Norte-coreanos estavam com os olhos em bico. Depois veio os cinco a três de autoria de José Augusto. No café as cervejas já não eram bebidas na totalidade. Atiravam-se os restos para o ar. Era uma festa de arromba. Acabado o jogo já não tínhamos vontade para dar continuidade ao que deixamos suspenso. Há que dar azo à alegria.
Assim disse: abençoada a noite de trabalho e o dia vinte e três de Julho de mil novecentos e sessenta e seis. Por todos estes motivos é que Eusébio é enorme. Tanto no cemitério do Lumiar como no Panteão Nacional.

Sunday, January 5, 2014

Adeus Eusébio:

Há muitos anos que deixou de jogar futebol mas manteve sempre o seu estatuto de Rei no futebol. Não teve uma carreira de treinador. Há jogadores que foram do melhor como jogadores mas não tinham vocação para treinar. Não se pode ter tudo. Mas uma coisa teve. A lealdade para com o Sport Lisboa e Benfica. Assim como o clube teve para com ele. Nunca o desamparou. É gratificante quando se vê a entidade empresarial segurar o maior ídolo.
Há vários clubes assim mas não muitos. Pelo menos em Portugal. Também não há muitos clubes a ter reis com Eusébio. Por isso os benfiquistas estão tristes e contentes por ver o que um homem é na vida do seu clube. Um clube não se torna grande pela soma dos troféus. O que o torna grande é a humildade e o modo como são tratados os seus atletas. E… quer queiramos ou não o Sport Lisboa e Benfica é um exemplo neste capítulo.
Por isso é digno ver o que a comunicação mundial diz de Eusébio e do Benfica. Pode-se morrer fisicamente. Mas a obra essa permanecerá para todo o sempre. Quantos se aproveitam desta situação para melhorar a sua conduta. Mas coitados.  

Friday, January 3, 2014

Passagem de ano ou virada de ano:

Já escrevi várias vezes que não ligo grande coisa à passagem de ano. Desde que me lembro os momentos em que senti maior alegria com a passagem de ano foi nos anos mil novecentos e setenta e um e dois mas por motivos pessoais. Cumpria serviço militar em Balacende, Angola, e ansiava que esses dois anos passassem rápidos para vir para o seio da família e amigos. Eram tempos difíceis e a distância era longa.
Depois sempre vi nas comemorações da passagem de ano uma forma de consumismo. Não digo que não deva haver. Sabe-se que o comércio, turismo e outras activades que asseiam pela chegada destas datas para que as finanças renasçam. Mas uma coisa é ser solidário com as necessidades destas instituições e outra é compreender a maneira exuberante como se festeja a vinda de um ano que à partida sabe-se que para os portuguese ainda vai ser pior. Só por puro narcisismo.
Mais a mais que não é uma passagem. Quando se dá uma passagem a pessoa ou coisa que a recebe assume o activo ou passivo. Mas aqui não. Os problemas transitaram e a vinda de outros está por breve. Ao menos se se pudesse varrer para debaixo do tapete como muitos fazem com o lixo ainda tinha atenuantes. Sendo assim têm razão os brasileiros de chamar à passagem de ano virada de ano. Porque a passagem de ano não foi mais que um virar de página. Tudo ficou igual. Quem devia ser passado ainda ganhou mais benesses.
Cavaco Silva sem pudor não se importa de prejudicar sempre os mesmos. E beneficiar os da sua laia. Que pena não lhe acontecer o mesmo que a Afonso VI. Não vejo personagem mais real para esse papel. Não tem cabimento nenhum no que faz, ou seja, o que faz é o que lhe mandam porque não tem voto na matéria e há quem diga que o mesmo acontece a ele como com D. Afonso Henriques. Passo a explicar:
Quando o jovem D. Afonso Henriques teve de assumir o poder da nação foram-lhe detectadas uma série de complicações psiquiátricas. Por esse motivo teve-se de se arranjar um substituto para tomar o lugar sem que o povo se apercebesse. Egas Moniz que tinha um rapaz à sua guarda da mesma idade e sexo viu nisso a forma de remediar a situação. É o que sempre ouvi dos “mentideiros”. Portanto não dou como seguro.
Assim como não dou como seguro como alguém disse há tempos que não é Cavaco Silva quem aparece na televisão e que toma as muitas más decisões mas sim um sósia. Duvido e não. Mas vendo as coisas há algo de real. Quem viu o primeiro mandado de Cavaco Silva fica perplexo com as decisões de hoje. Quando invectivava os jovens para a insubordinação no governo de Sócrates porque o povo não aguentava tantos sacrifícios este era o verdadeiro Cavaco Silva. Por isso a minha desconfiança por tal mudança. E não concordo com a passagem de ano. Porque o que está a acontecer é como dizem os brasileiros: viragem de ano: 

Tuesday, December 31, 2013

Quem devia acabar hoje era o governo:

Caminhava pela rua fora com dificuldade. O peso dos dias fazia-se sentir no seu “lombo” além do saco de sarapilheira com os poucos haveres que sobraram dos trezentos e sessenta e cinco dias. Sabia que o seu fim estava por horas. Por isso o arrastar pelas ruas da sua terra para todos verem o quanto é difícil chegar a velho. Nestas situações todos esperam a sua “ida” com alegria. Fazem festas. Gasta-se rios de dinheiro para comemorar a vinda de outro. Desde que o Mundo é Mundo é o que tem acontecido.
Mas se olharmos para o passado cada vez mais somos contemplados com anos piores. Mesmo assim continua-se a gastar rios de dinheiro para termos anos piores. O povo enlouqueceu. Fazem-se greves por tudo e nada. Porque não para mantermos este ano sabendo de antemão que vem aí um ainda pior. Mesmo assim este não foi tão mau como o que substituiu. Conseguiu a reposição de certas regalias sociais através do Tribunal Constitucional o que veio dar mais folga às finanças dos portugueses. Por isso não compreendo a ânsia de o mandarem embora. Usa-se dizer: “atrás de mim virá quem bom me fará”. É o que vai acontecer. Embora este fizesse esquecer o de dois mil e doze. Assim, aconselho a não se exorbitarem com a vinda do de dois mil e catorze porque as uvas passas vão sair estragadas.  
Depois desta reflexão vai continuar pela rua fora com dificuldade e o saco de sarapilheira com os poucos haveres que conseguiu juntar. Aliás, o que este governo permitiu que juntasse: miséria! Não se envergonha da sua situação. O mesmo está a acontecer a ele como aos idosos deste País. Só que com os idosos não lhes fazem festa e gasta-se rios de dinheiro: esperam que morram. 

Sunday, December 29, 2013

A greve ao lixo em Lisboa:

António Costa, presidente da Câmara Municipal de Lisboa, tem feito apelos para os lisboetas reterem o lixo dentro de casa enquanto vigorar a greve. Acontece que há cidadãos que não querem cumprir o apelo. Para os lados de Belém, como se sabe, é onde há mais lixo em Lisboa, os moradores estão a contrariar o apelo e pedem para o depositar no Palácio de Belém pois dizem que é mais tonelada menos tonelada e que ali é onde está o maior contentor de lixo. 

Friday, December 27, 2013

O Natal passou:

Agora as pessoas esperam a vinda do Ano Novo. Não com a ânsia de outrora. Essa já era como costumamos dizer. Até o tempo nos lembra como este Natal foi pobre. A chuva que caía parecia lágrimas nas faces dos portugueses. Sim! Que quando chove há quem diga que são lágrimas da mãe Natureza. 
Os seres mortos não têm vida mas quase que nos fazem lembrar o contrário. E para não fugir a essa regra Freamunde também mostrou essa pobreza. Os tempos não estão para flostrias. Outras necessidades podem ser mais prementes. Assim para poupar há que inovar. E, com poucos gastos há que dar um aspecto de como é Freamunde. Terra e gente de eventos. Terra e gente de simplicidade. 

Thursday, December 26, 2013

O Madeiro e a conversa em Família:

Hoje o apetite é pouco para escrever um texto. Temas não faltam. Desde o madeiro em Penamacor à conversa em família de Passos Coelho. Se em Penamacor era queimar o Madeiro em S. Bento era queimar os últimos cartuchos para convencer os portugueses. 
Mas eles não vão em cantigas. Gato escaldado de água fria tem medo. E Passos Coelho não é fiável. António José Seguro não faz uso do apelido. Coitados dos dois. Não convencem ninguém. A não ser a comunicação social que anda ávida de notícias. E quando isso acontece tudo o que vem à rede é peixe.    

Wednesday, December 25, 2013

A noite de Natal:

Nunca mais passava. O relógio não fazia os ponteiros movimentarem-se como o Diogo desejava. Nos seus “míseros” sete anos custava-lhe compreender porque os minutos tinham sessenta segundos as horas sessenta minutos e os dias vinte e quatro horas. Para alguns momentos vá que não vá. Agora numa noite de natal! Isso não. São muitos minutos e horas. Ou havia de estarem munidos com outro ponteiro para situações como estas. Ah se estivesse! Há muito que tinha ido ali mexer e o manobrava à sua feição.
Neste momento o relógio da igreja matriz de La Ricamarrie acabou de dar as cinco horas. Que lentidão. O espaço entre uma e outra badalada parecia uma eternidade. É impossível que não esteja com “fome” e custe-lhe “trabalhar”. Quando acabar as férias da catequese vai pôr este problema à catequista. Ou ao padre. Não pode ser tão molengão. Ou será que a ânsia de receber os presentes do pai natal o leve a adjectivar o relógio da igreja.
De certeza que não o merece. Está ali há vários anos. Lembra-se de o ver sempre ali. Também só tem uns “míseros” sete anos. Mas ainda se recorda de alguns meninos lhe atirar pedras. E… ele sem resmungar continuava na sua lenta agonia de subir e descer. Para mais até alcançar a hora os últimos trinta minutos são a subir. Por isso lhe custe dar as badaladas. Vê-se que está ofegante pelo sacrifício dos últimos trinta minutos.
A continuar assim nunca mais chega a hora de clarear o dia. Sim! Noutros anos só ia buscar as prendas ao sapatinho com o dia já “levantado”. É que lhe dizia a sua mãe se o fizesse ainda com a noite a “pé” no ano seguinte não era contemplado. Por isso o aguentar todos os minutos e horas para no ano seguinte não ser rejeitado. Mas que dá vontade de o fazer isso dá.
Deram as sete horas. A lentidão com que foram badaladas trouxera o clarear do dia. Agora a ânsia que tinha passou a receio. Não sabia qual a sua prenda. Em casa ouvia dizer que o pai natal dava conforme recebia. E o que ele tinha dado ao pai natal! Só aborrecimentos? Não. Na escola não era dos melhores mas dos piores também não. Na catequese era assim, assim. O pior era nas lides de casa e nos recados que a mãe lhe mandava fazer. Mas isto não era o bastante para estar com receio. Então os meninos que atiraram pedras ao relógio da igreja matriz ainda tinham que dar prendas ao pai natal pelas malfeitorias. Não! O pai natal não é vingativo. É uma espécie de avô materno ou paterno. Assim como o meu. Que só vê o mal julgando-o bem.
Agora as horas no relógio da igreja matriz passam normalmente. Os minutos tem sessenta segundos as horas sessenta minutos e o dia vinte e quatro horas. Já antes o tinham. Só que as suas precisões queriam se sobrepor à normalidade da vida. Agora pensa assim porque já viu a sua prenda. E que prenda! Ali está ela ao pé do seu sapatinho. Sabe que é dele porque é filho único. Que linda! Era assim que via a sua bicicleta. 
Toda azul.

Sunday, December 22, 2013

Naquele tempo não havia Pai Natal:

A noite estava horrível. Quem se importava com o estado da noite! Naquele tempo não se sabia de antemão como ia estar o tempo. Eram tempos em que a tecnologia só nos tinha dado o Telefone e o Rádio. Ainda recordo o primeiro telefone público na minha terra. Estava afixado na Padaria Mendes. Alguns iam ali efectuar chamadas telefónicas ou recebê-las. Os mais humildes até tinham receio de enfrentar o telefone. E quando ali eram chamados para receber uma chamada mais medo tinham. Sabiam que não iam ser boas notícias. Uma desgraça ou a morte de qualquer familiar que vivia fora da terra. Eram estas notícias que vinham pelo telefone. Se outra fosse era mandada por recado.  
O rádio era diferente. Transmitia relatos de futebol e música. Mas também era raro nas casas dos mais pobres. Não era só pelo seu custo. Também era porque a maioria das casas não eram possuidoras de electricidade. Assim só restava ir para um café ou taberna ouvir a rádio. De ouvidos bem atentos ouviam o relato do Benfica do Sporting ou Porto. Música era o que mais dava. Convinha ter o povo distraído com este tipo de emissões. Assim não pensavam na política. Não reclamavam da miséria que lhes ia porta adentro.
A noite continuava horrível. A chuva e a trovoada fazia-se ouvir. Que interessava. Se naquela noite não ia sair de casa. Só pensava nisso porque estava para chegar a casa uma filha que era criada de servir no Porto. A camioneta da carreira já devia estar a chegar. Como precaução mandou o seu filho mais velho esperar a irmã. Mas estava aflito porque a noite estava horrível. Raramente vinha a casa. Mas neste dia que já entrava na noite, vinha.
Vinha três vezes no ano. Pela Páscoa, festas da Vila e Natal. Era o que acontecia nesta noite. A hora do jantar aproximava-se e eles não chegavam. Já não era só pela noite horrível. Era também pelos presentes que tinha pedido a sua filha para comprar no Porto. Não era que não houvesse em Freamunde casas com tais quinquilharias. Haver havia. Mas o dinheiro era tão pouco. Como a sua filha ia receber a mensalidade comprava no Porto. Por que ele só recebia a semanada no sábado, último dia, de trabalho semanal. E como a véspera de Natal tinha calhado numa quarta-feira não havia dinheiro de sobra para esse efeito. E como pai gostava de dar algo aos filhos. Fosse a coisa mais insignificante. Mas que gostava de dar gostava.
No seu tempo de criança era raro receber. Também não tinha um par de sapatos para pôr ao pé da lareira. Tempos horríveis. E a noite continuava horrível. E não havia maneira de chegar. Teria perdido a camioneta! Oxalá que não. Estava entretido neste pensamento e nem deu pela chegada dos dois. Também quem podia ver com uma noite horrível. Não havia luz pública no lugar em que habitava.
Ainda recorda uma noite em que uma sua filha adoeceu e teve que a levar a casa do médico. Ele com a filha ao colo a mulher com um candeeiro a petróleo para os alumiar. Mesmo assim era topada atrás de topada. O que interessava era não deixar cair a menina. Já bastava o estar doente.
Cogitava nisto quando a sua filha chegou junto dele e lhe deu beijo. Estás mais gorda e bonita, disse para sua filha. Mas deixemo-nos destas formalidades porque está na hora de jantar. Está bem mas primeiro vou desfazer a mala, disse a filha. Não quer ver os presentes para os meninos? É melhor não. Eles podem-se aperceber e depois não crêem no menino Jesus. Sim! Naquele tempo não havia Pai Natal. Era o Menino Jesus que trazia as prendas. 

Thursday, December 19, 2013

Exemplo:

De vez em quando “passeio” pelo YouTube à procura de vídeos de referência para neles rebuscar actos ou estórias que nos digam algo sobre a humanidade. Estou farto de ver ou ouvir na comunicação social sempre o mesmo. São tão repetitivas as notícias de hora a hora nos canais fechados e, nos generalistas sempre os mesmos programas com um prémio diário mediante chamadas telefónicas de custo acrescido. 
Anda quase toda a gente depressiva e para nos pôr com maior depressão ainda temos essas televisões e pivôs sempre a dizerem o mesmo. Ou em contrapartida levam ali pessoas para entrevistar o que tem acontecido amiúde mas todos com estórias surpreendentes quando não são os do Big Brother. Não aparece ali ninguém com um passado de insucesso. Sabe-se que nem tudo são rosas. E as mais bonitas têm espinhos. E que espinhos!
Quantos de nós damos uma retrospectiva totalmente falsa. Ou queremos dar o passo maior que a perna. Neste nosso Portugal quantos de nós mostramos uma imagem não condizente com o que somos. Começando pelos políticos. Dizem uma coisa e é outra. Nesta época natalícia - não devia ser só nesta - todos devíamos dar a mão em prol da humanidade. Todos mas todos voltarmos à nossa condição. Deixarmos de grandezas e repararmos que somos uns insignificantes. Que o Mundo é grande mas não é grande coisa. Que ao mínimo sopro entra em colapso. É tempo de darmos as mãos. De não nos julgarmos superiores. Ver no nosso concidadão algo de útil. E não à mínima coisa não o desconsiderar. Por que ele às vezes dá-nos lições de moral.
O vídeo é sobre um poema de Fernando Pessoa. 
"Poema em linha recta" 

Tuesday, December 17, 2013

Só pode ser:

Os deuses - a Associação da Imprensa Estrangeira em Portugal - deve(m) estar loucos! Ou são todos marxistas. Só pode ser. Então vão eleger Mário Soares como a personalidade portuguesa de 2013. Continuo a dizer que só pode ser. Mas… olho para o calendário e nele vejo o dia de hoje como sendo dezassete de Dezembro e não dia um de Abril. E… pela terceira vez digo: só pode ser. Então não eram carradas de comentaristas, politólogos, comentadores e jornalistas que diziam que Mário Soares devia estar calado porque da sua boca só saía asneira!
A confusão que me causou esta notícia. Li e reli para ver se não estava a cair em erro de simpatia. Sim. O erro de simpatia dá-se quando lemos conforme queremos e não o que está escrito. Era o que julgava que me estava a acontecer. E… em vez disso o nome ali escrito era o de Cavaco Silva. Mas logo esta ideia desvaneceu-se. O muito que Cavaco Silva pode ter feito foi dar cabo da Agricultura, Pesca e Indústria em favor dos jipes dos seus amigos e ter denunciado o seu sogro por ser casado em segundas núpcias. Fui ver o seu cadastro e currículo e é isso que lá consta.
Assim não acreditei que a dita Associação ia eleger um tipo por feitos desses. Mas também não fiquei muito convencido pela atribuição a Mário Soares. Então um sujeito que há muito já não devia andar neste mundo anda a arrecadar prémios a outros que também o merecem! Por isso lembrei-me logo de Henrique Monteiro, Braga de Macedo, Alberto Gonçalves, César das Neves, Marcelo Rebelo de Sousa e tantos outros que vêem Mário Soares como um cadavérico.
Coitados! Cadavéricos são eles. Ou aliás. Mário Soares é um corpo velho com cabeça nova. Os outros são uns corpos novos com cabeças velhas. Por isso não me admira que Associação da Imprensa Estrangeira em Portugal tenha elegido Mário Soares. É que eles avaliam cabeças e não corpos. Se assim fosse iam buscar uma Misse Mundo.       

Monday, December 16, 2013

O efeito Sócrates:

O Governo, ou melhor dizendo Miguel Relvas, deve estar com as orelhas a arder pela iniciativa de dar um programa semanal a José Sócrates aos domingos na RTP 1. Julgo que quando acederam nunca pensaram que o tal programa viesse a ter o efeito contraproducente que está a ter. Fizeram-no no sentido das audiências mas não se importavam de as perder.  Se agora pudessem voltar atrás de certeza que o fariam. Estão habituados a fazer o mal e a caramunha. Mas com José Sócrates desenganam-se.
Todos os domingos demonstra como este governo engana os portugueses. E fá-lo com documentação. O mais bonito é que os membros do governo atingidos não vêm para a “praça pública” contestar. Sendo assim admitem. Por mim fico feliz por ver tal argumentação. Não perco um programa - se não o puder ver em directo gravo-o - mas há seguidores fidedignos que além de os gravar põem-nos no Youtube, Blogues ou Facebook.
Não é preciso ter uma eternidade de tempo de programa. A concorrência - como agora é usual dizer-se - bem prolonga o tempo de duração de entrevista do seu entrevistado dominical mas, mesmo assim, a maioria dos portugueses que gostam de estar informados não deixam de ouvir José Sócrates. Preferem ouvir a realidade da política e não a encomendada como faz Judite de Sousa. Não faz perguntas pertinentes a Marcelo Rebelo de Sousa como o caso de Braga Macedo com a Constituição da República Portuguesa e o Tribunal Constitucional. Prefere ouvir a publicidade aos livros.
Se em Portugal houvesse um Presidente da República chamava à pedra Braga de Macedo por lesar a Pátria. Mas como não temos Portugal está ao sabor destes traidores. Braga de Macedo não dizia que a Constituição está cheia de artigos marxistas se pudesse fazer as trafulhices a favor da sua filha Ana de Macedo. Tantos portugueses que tudo deram pela Pátria, mesmo no apogeu da sua juventude e, que nada beneficiaram, devem-se sentir indignados com tais declarações. Mas isso são os verdadeiros portugueses e não os plastificados.
Pois era isto que gostava de ouvir da boca de Marcelo Rebelo de Sousa. Mas não! Vai ali para fazer a sua homilia. Podia dizer que há muitas e boas pessoas que não se importam que lhes chamem marxista. Por exemplo: Papa Francisco assegura que não é marxista, mas que não se ofende se o apelidarem.
Por isso prefiro mil vezes ouvir José Sócrates que outros troca-tintas.   

Sunday, December 15, 2013

Ainda sobre a feira dos capões e Santa Luzia:

Como é bom enviar responsabilidades a outras pessoas esquecendo as que realmente fazem parte do evento. Há muitos anos que Associação de Jovens ao Futuro (AJAF) e desde que se formou a Confraria do Capão têm sido as impulsionadoras da divulgação do Capão à Freamunde e da feira dos capões. No que concerne à parte religiosa esta está a cargo da igreja. Por isso quando se desresponsabiliza estas duas agremiações não se está a ser justo nas críticas. Mais a mais sabendo que a Junta de Freguesia de Freamunde só foi eleita em finais de Outubro o que tornava curto o tempo para o evento. Além do mais não se tem a experiência de quem há vários anos assumia esse evento.
De qualquer maneira não estou a desculpar a Presidente da Junta de Freguesia de Freamunde porque entendo que não tem culpas. Se assim fosse estava aqui quem a criticava. Aliás, quando ontem me foi dito que a Junta de Freguesia não autorizou nova feira no dia de ontem escrevi a revelar esse dito. Mas não é como dizem.
Sempre que se repetiu a Santa Luzia calhou num sábado. Até porque não faz sentido uma vez que há várias feiras e mercados aos sábados. Por isso a maioria dos feirantes tem lugar marcado nessas feiras ou mercados. Agora… sempre que a Santa Luzia calhava ao sábado no domingo havia continuação da feira.
Também não me recordo de a Santa Luzia ser festejada ao domingo em troca com o seu dia de calendário. Não sou velho nem novo. Mas tenho idade suficiente para me recordar a partir do meio século do século passado a celebração da Santa Luzia no dia treze de Dezembro. E… como me recordo de andar a carregar capões.
Por isso quando se critica deve-se criticar mas com crítica construtiva. Porque parece que se anda atrás de defeitos para se angariar votos. Mas as eleições autárquicas só são para dois mil e dezassete. E não queiram que um bebé que ainda não tem dois meses saiba andar como um adulto. A Santa Luzia de uma forma ou de outra é de todos os Freamundenses e de quem nos visita nesse dia. Não queiram ser mestres. A Santa Luzia agradece que não se meta política.
Critiquem a Junta de Freguesia noutras áreas. Mas até nisto não podem porque como disse o tempo ainda não dá para análises. Até lá fazia bem um chá de Tília ou a esfrega de barriga. Porque quando as dores não passam dizem que faz bem. E mais não digo.

Saturday, December 14, 2013

Não há provérbio mais verdadeiro. Mas muitas vezes não se faz o que ele nos manda. Umas vezes por deixar andar, outras porque somos preguiçosos e ainda outras porque contamos com ovo no cu da galinha. Se assim não fosse e como o dia de ontem, de S. Luzia, foi uma desgraça para o comércio local e feirantes que, todos os dias treze ou vinte e sete de cada mês, dias de feira em Freamunde, aqui vem no intuito de fazer negócio. Os ganhos nas feiras quinzenais são irrisórios e por isso os feirantes esperam que a feira de S. Luzia lhes traga outros proveitos.
Assim como as pessoas que vão feirar esperam uma variedade de artigos para ali poderem regatear. É sabido que a economia do país vai pela hora da morte e todos os cêntimos aproveitados vão fazer um melhor equilíbrio nas finanças domésticas.
Sendo assim, hoje fiquei admirado de não ver exposto no lugar da Feira nenhum feirante. Pensei para mim: mesmo com o dia mau (de ontem) foi bom para o negócio. Senão aproveitavam o dia de hoje para voltarem a expor os seus artigos. Isto é o que eu pensava.
À tarde foi-me dito que a razão de não haver artigos expostos se deveu a que a Junta de Freguesia não autorizou a comercialização neste sábado. Quem me disse assegurou-me que foi um feirante que lhe deu a notícia. Tenho por pessoa cordata quem me deu a notícia.
Mas… também não me convenço que a Junta de Freguesia não autorizasse tal iniciativa. Porque sabe a falta de negócio que passa o comércio de Freamunde. E tudo o que se possa angariar só traz vantagens à Junta de Freguesia. Uma Junta de Freguesia governa bem se vir os seus fregueses bem de vida. E não o seu contrário.
Por isso ser favorável a que o que não se faz no dia de S. Luzia se faça ao outro dia.  

Da grandeza e do deslumbramento:

Podíamos falar da chegada do homem à Lua em 1969, das bombas atómicas em Hiroxima ou Nagasáqui em agosto de 1945, do princípio da libertação da Europa ocupada pelos nazis com o desembarque na Normandia em 1944, da queda do Muro de Berlim em 1989, da morte criminosa de seis milhões de judeus durante a II Guerra Mundial, dos gulags estalinistas que marcaram o século XX, ou dos ataques de 11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos da América, só para dar alguns exemplos.
Podíamos até ser mais frugais (ou paroquiais) e falar do nosso regresso à liberdade a 25 de abril de 1974. Ou, até, comezinhos e apontar o nascimento de um primeiro filho ou de um neto.
Mas Cavaco Silva, com a sua proverbial hipocrisia política e notório provincianismo, elegeu para acontecimento "mais marcante" de sempre não o desaparecimento de Ben Laden ou de Hitler, de Kadhafi ou de Saddam, mas a morte esperada e natural de um ancião de 95 anos. "O Presidente Obama veio, foi simpático e cumprimentou-nos muito à vontade. Estava sentado muito próximo de mim e do senhor ministro dos Negócios Estrangeiros", disse, sem disfarçar o deslumbramento de quem esteve no mesmo palco com algumas das maiores figuras do planeta.
Ao contrário do Presidente da República, nunca estive com Nelson Mandela. Nunca o conheci pessoalmente. Mas nem era preciso para descortinar naquela figura e naqueles olhos a grandeza moral do personagem.
De facto, se houve acontecimento marcante e inspirador, foi a vida e não a morte de Mandela. Se há motivo para celebrar, é o exemplo de luta travada com coragem, em todas as suas dimensões, em nome da libertação de um povo subjugado por um regime racista e criminoso. Se há memória ou legado que não podemos ignorar é, por exemplo, o discurso proferido no Supremo Tribunal de Pretoria, a 20 de abril de 1964, antes de ser condenado a perpétua, em que justificou as razões do recurso à violência, "depois de tudo o resto ter fracassado" na defesa dos mais elementares direitos humanos da maioria negra, abjurando o racismo, "venha ele de brancos ou de negros". Do que se tratou, durante demasiados anos, foi do pleno exercício de legítima defesa contra a selvajaria desumana de um governo opressor e delinquente que nem sequer reconhecia coisas tão básicas como o facto de "os negros também terem emoções, também se apaixonarem". E é por isto que, mesmo que com prejuízo da realpolitik, do que se tratava em 1987 era de estar do lado justo da história.
E nem sequer vale a pena invocar o artigo 21.º da nossa Constituição - Todos têm o direito de resistir a qualquer ordem que ofenda os seus direitos, liberdades e garantias e de repelir pela força qualquer agressão, quando não seja possível recorrer à autoridade pública - ou o falso argumento da defesa dos interesses da comunidade portuguesa. Nessa época, já todos tinham percebido que o apartheid estava, felizmente, a chegar ao fim e que uma nova era haveria de nascer, mais dia menos dia, na África do Sul. Daí que, não fora o gigantismo moral de Mandela, muito provavelmente os primeiros alvos dos hoje impensáveis ajustes de contas teriam sido os emigrantes dos poucos países que, como nós, eram condescendentes com o regime.
Inesquecível foi o dia da sua libertação após 27 anos de cárcere ou a data em que foi eleito o primeiro presidente negro da África do Sul.
A estatura de Mandela, que tinha obviamente muitos defeitos e assumiu tantas vezes opções discutíveis, mede-se pelo exemplo. Pela capacidade de pegar em armas quando foi preciso para defender a dignidade humana, de dar a mão aos carniceiros quando foi necessário evitar banhos de sangue e apaziguar um país inteiro, de pedir também ele perdão pelos excessos cometidos pelo ANC plasmados nos documentos finais da Comissão de Verdade e Reconciliação.
E é por isto e muito mais que Nelson Mandela ficará para sempre como figura maior da história. Outros, nem que nasçam duas vezes, jamais passarão de uma nota de rodapé.
NUNO SARAIVA
Hoje no DN

Wednesday, December 11, 2013

Tudo como dantes no quartel de Abrantes:

Regressados de Joanesburgo as coisas já não são como ali se fazia crer. Tudo não passou como diz o povo: para inglês ver. Os candidatos a Nelson Mandela vestiram as suas vestes, as que vestiam nas cerimónias eram alugadas, como não houve prova, não assentavam bem na pessoa e, (deu no que deu). É o que se usa dizer: a cara não condiz com a careta. Assim, nada há como cada um remeter-se ao seu papel.
Pode-se ser bom actor mas os papéis principais são difíceis de executar por terceiros. Seja Barack Obama, Raúl Castro ou outro qualquer, o que fazem é como disse acima: para inglês ver. As televisões captaram o momento, fizeram dele eco, mas não passou disso.
Na parte da tarde do mesmo dia, apareceu o Secretário de Estado Americano, Jonh Kerr, a desvalorizar o acto. E nós povo, que não percebemos de diplomacia, fazemos votos e preces para que cheguem a acordos. Mas, depois como conseguem alimentar essa mesma diplomacia? É que tem de se arranjar motivos para se fabricar armamento. Se assim não for perde-se liderança e com isso as sondagens descressem. Por isso tem de se alimentar quezílias para dar mostras que a sua intervenção - neste caso os E. U. A. - vai sossegar as suas hostes. E o que foram horas e dias de júbilo depressa voltou à realidade.
Dizem que o Mundo foi feito em sete dias, como são poucos dias e, o Mundo é muito grande alguma coisa falhou. Digo alguma mas sei que estou a ser benévolo porque falhou muita. Nem Deus que dizem - e creio que sim - que foi um ser superior conseguiu pôr cobro nisto o que farão uns seres humanos cheios de vícios e erros.
O que interessa é mostrar ao Zé-povo que tudo corre como dantes no quartel de Abrantes.

Queremos um país decente:

Com a devida vénia, cito aqui uma frase escrita na última edição do jornal "Expresso" por Henrique Monteiro, na crónica que publica na última página do semanário. "Ao preço a que temos pago esta crise não quero mais um país mixuruca (como dizem os brasileiros). Quero um país decente. Um país competente, com uma administração pública adequada às necessidades, sem boys a cada esquina, sem corrupção, sem discursos inflamados e extremistas de reviralhismo de café. Quero um país europeu". É impossível não estar de acordo com isto, dada a extensão gigante do que nos tem sido pedido.
Sabemos todos que o quotidiano dos portugueses é hoje o que há uns anos ninguém se atreveria a prever. É verdade que os mais realistas (então apelidados de miserabilistas, para dizer o mínimo) foram falando dos erros de estratégia e de trajetória que sucessivos governos iam cometendo. Mas ninguém julgaria que pudéssemos chegar ao ponto em que estamos.
E em que ponto estamos? Estamos no ponto em que a palavra decência, forte no conteúdo, saiu do dicionário, sendo substituída por outra que serve para justificar uma coisa e o seu exato oposto: a inevitabilidade. É em nome do "inevitável" que se atropelam direitos uns atrás dos outros. É em nome do "inevitável" que jogamos um jogo em que as pessoas são meros fatores de uma equação matemática em que, no fim do dia, o que verdadeiramente interessa é que as colunas do Excel batam certo. É em nome do "inevitável" que, para regressar a Henrique Monteiro, descemos ao estatuto do país mixuruca. Absolutamente mixuruca.
Sim, porque só um país absolutamente mixuruca permite que os mais fracos, os que mais sofrem, os que pouco ou nada têm possam ser ainda mais fracos e sofrerem ainda mais. O texto que sustenta a manchete da edição de domingo do "Jornal de Notícias" é o exemplo mais chocante dessa realidade. É difícil imaginar pior. O que a jornalista Inês Schreck escreveu não é um murro no nosso coletivo estômago: é um valente soco nas fundações de um país que abana e ameaça cair. É uma vergonha.
Cito-a: "Há cada vez mais doentes oncológicos em grandes dificuldades económicas. Não têm dinheiro nem para comer, pondo em risco a própria recuperação. Os pedidos de ajuda disparam". Estamos, portanto, a deixar morrer pessoas com cancro que não têm dinheiro para se alimentar, ou para pagar as consultas e os medicamentos de que necessitam.
Cito o presidente do Núcleo Regional do Norte da Liga Portuguesa contra o Cancro: "Há famílias inteiras que, de um dia para o outro, ficam na miséria, porque o cancro atingiu o único elemento [do agregado familiar] que trabalhava".
Cito o retrato dramático de uma dessas famílias: o pai está inválido e desempregado, a mãe tem um cancro raro e hereditário em estado avançado e duas filhas menores a seu cargo, sendo que uma delas também é doente oncológica. Todos vivem agarrados a uma pensão que não chega aos 300 euros.
Cito, em conclusão, um país que se entretém com o "reviralhismo de café". Cito um país que deve envergonhar-se de si próprio. Que não é decente.
Publicado ontem no JN

Tuesday, December 10, 2013

Afinal não houve luto! Houve alegria:

Hoje Joanesburgo na África do Sul é a cidade mundial onde estão os Presidentes da maioria dos países do Mundo. O motivo é o luto que aquela nação cumpre com o seu filho mais conhecido no Mundo. Era bom que não fosse. Mas derivado à idade avançada e aos últimos dias complicados de Nelson Mandela com a sua saúde previa-se este desenlace. Esteve vários dias de coma e os Sul-africanos aperceberam-se que o seu fim estava próximo.
Lutou a maior parte da sua vida pela vida dos seus conterrâneos que tiveram a infeliz sorte de terem nascido de cor diferente da maioria dos decisores do Mundo. E quer queiramos ou não este Mundo sempre teve Hitleres. Seja pela cor da pele, pelos seus ideais, estes seres aberrantes nunca suportaram a diversidade. Ou eram iguais a eles ou desapareciam. Foi o que fez Hitler aos Judeus. 

Não suportava a sua inteligência e habilidade para o negócio. Assim há que persegui-los até os meter a todos nos vários campos de concentração. Só que como em todos os tempos houve e há pessoas imbuídas dos maiores sentimentos humanistas como Aristides Sousa Mendes e outros que com risco de vida valeram a esses infelizes seres. Aristides Sousa Mendes perdeu tudo. Menos a sua dignidade. E o que a história condena - caso, a de Portugal e Salazar - mais tarde essas pessoas tornaram-se heróis aos olhos dos familiares das vítimas e seu povo. E são acarinhados pelo povo mais simples.
Nelson Mandela pôs sempre a sua vida ao serviço dos seus concidadãos de cor. Vinte e sete anos preso é uma eternidade na vida de uma pessoa. Sempre as mesmas pessoas, as mesmas paredes e muros. É de tornar um ser lúcido num louco. Aristides de Sousa Mendes não passou por isso. Mas teve a sua dose. E que dose! Neste dez de Dezembro ao falar do que acontece em Joanesburgo não queria deixar passar em claro o grande feito de um português. Não teve o feito e sofrimento de Nelson Mandela. Mas Aristides de Sousa Mendes defendeu pessoas que não lhe diziam nada. A não ser a parte humana.
Como ia dizendo Joanesburgo está repleto de pessoas a homenagear Nelson Mandela. Na televisão vi Presidentes a discursar sobre a vida e obra de Nelson Mandela. Do nosso nada. Para nosso consolo e da nossa língua lá apareceu a Presidente do Brasil, Dilma Rousseff, a fazer o elogio em seu nome e do povo brasileiro.
A maioria era anónima, não discursou, mas o seu fervor ia de encontro ao ideal de Nelson Mandela. Como se sabe entrou na cadeia como agitador ao governo da África do Sul e saiu dali passados vinte e sete anos como apaziguador desse governo. Juntou brancos e pretos, cristãos e não cristãos, homens e mulheres. Aqui se vê o erro que certa “humanidade” cometeu perante um homem que apenas queria que o seu povo fosse parte integrante dos problemas da África do Sul.
Uma grande parte do Mundo ignorou-o. Quiseram-no enjaular como se fosse um macaco. Aliás, tratavam-no assim a ele e ao seu povo. Foi como esconder lixo debaixo do tapete. Hoje muitos deles ali apareceram como se nada fosse. Fazem ou fizeram como Pôncio Pilatos. Pediram a pia de água e a toalha e depois de decidirem a sentença lavaram as mãos. Mas as suas consciências devem estar pesadas.
Ao contrário a de Nelson Mandela está leve como a de um passarinho. Por isso perdoou a quem lhe fez bastante mal. É a diferença que há entre os vultos grandes e pequenos. E Nelson Mandela sempre nos habituou a essa grandeza. Pena outros não. 
E… é com estas atitudes que a história se faz. Para depois dizermos: afinal não houve luto! Houve alegria.

Monday, December 9, 2013

Este aforismo diz-nos tudo. É como: vê-se caras e não corações. Quantas caras se vêem e não sabemos o que vai no coração. O homem tem por natureza um pouco de actor. Disfarça mais ou menos qualquer situação quer seja mais favorável ou menos. Não é só actor quem trabalha no cinema ou teatro.
Aliás, o teatro que nasceu antes do cinema, veio retratar cenas do quotidiano. Por isso e como não podia deixar de ser o actor foi da vida real para o teatro e não o seu contrário.

Como se diz de são e de louco todos temos um pouco também acontece no que concerne aos actores: de actores todos somos portadores. O certo é que na vida real cada um desempenha o seu papel.
Ao contrário no teatro ou cinema desempenha-se o de outros. Por isso os ensaios e os papéis atribuídos. Porque desempenhar o papel de outrem não é assim tão fácil. Assim como não é fácil por vezes desempenhar o nosso. O que nos vai na alma. Os desabafos que não votamos cá para fora por decoro e vergonha.
Desconfia-se mais hoje que ontem que a classe média está a passar por tremendas necessidades. A vergonha e o seu modo de actuar (actor) escondem essa miséria. Ai se pudéssemos exteriorizar ou se as paredes falassem. O que se diria!
Assim vamos continuando a desempenhar o papel de actor, uns melhores que outros e, o consumidor (governo) vai pensando que tudo decorre dentro da normalidade. 
E... depois o aforismo continua em uso: Só sabe o que se passa no Convento quem está lá dentro.
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